Estamos
consternados e assustados: são mais de sessenta mortes por homicídios em dois
anos em Viçosa. Números de guerra a que estávamos acostumados apenas longe de
nós. Tiros, corpos no chão e nas fotografias (impróprias) dos jornais, medo e
tristeza mortal em muitas famílias.
O
que está acontecendo? Esta é a pergunta que nos tem deixado aturdidos, porque
as respostas são muitas e, em grande parte, inconclusivas e insatisfatórias.
Na
tentativa de colaborar, proponho refletir a partir de outra pergunta: como
chegamos a isto? Tal caminho me parece mais viável, uma vez que nada acontece por
acaso. Acredito que tal pergunta nos ajuda a pensar que, de alguma forma, todos
somos responsáveis pelas situações nas quais vivemos.
Obviamente,
por ser padre, não quero oferecer reflexões de cunho sociólogo, psicológico ou
oriundas de outras ciências humanas também necessárias, mas pretendo contribuir
com reflexões que vêm do campo da fé.
Há
uma música que gosto, cujo refrão diz: “A paz que é tão sonhada, cantada em
canções tão lindas, só chegará até nós quando ouvirmos a voz do Senhor”. Assim,
inicio esta reflexão apontando para este caminho: ouvir a voz do Senhor.
São
Tiago nos diz na Bíblia que a “fé sem obras é morta”. Portanto, ouvir a voz do
Senhor não é apenas afirmar que se tem fé, mas colocá-la em prática na vida,
como ensinou Jesus em Mt 7,21 “não é aquele que me diz Senhor, Senhor que
entrará no reino dos céus, mas sim, aquele que ouve a Palavra de Deus e a põe
em prática”. Jesus, nesta palavra, diz que só uma pessoa sem juízo constrói a
sua casa em cima da areia; o que significa deixar de construir a sua vida sobre
a Palavra dele. A pergunta que podemos então fazer a nós mesmos diante da realidade
que nos envolve é se não estamos construindo nosso mundo em cima de areia.
Quando
uma sociedade permite festas com bebida liberada para adolescentes e jovens
muito jovens, não está construindo sobre a areia? Quando jovens escolhem (e
lhes é concedido) viver sem qualquer limite, tornando-se reféns de todo tipo de
desejos; quando vemos o número alarmante de crianças que tem nascido de
relacionamentos sem qualquer compromisso e que crescerão em lares despreparados
para acolhê-las, não é também construir sobre a areia? Basta apenas fazer leis
obrigando a distribuição de camisinhas e continuar veiculando a ideia de que o
sexo seja uma fonte de diversão a ser usufruída sem nenhum comprometimento?
Nestes
anos em que sou padre, tenho visto que apenas uma minoria dos pais se esforça
de verdade por oferecer o horizonte de uma fé viva a seus filhos. No entanto, o
que percebo é que é muito fácil a pessoa perder o sentido último das coisas, o
significado profundo do amar, do perdoar, do respeitar ao outro como um irmão, se não tem algo que a transcenda, que vá além das aparências do que se vê. Há
muitas coisas que fazemos ou que deixamos de fazer unicamente porque temos fé.
Sem ela, até matar alguém pode ser racionalmente justificável. Não oferecer a
alguém condições para o desenvolvimento da fé não seria também construir sobre
a areia?
Entre
tantos caminhos possíveis nesta reflexão, cito, para terminar, a falta de juízo
do nosso mundo em relação ao dinheiro. Submeter a natureza, o exercício da
profissão, os sonhos das pessoas ao dinheiro é, sem dúvida, construir sobre a
areia. E como temos sido sem juízo neste ponto! Quando não se paga salários
justos, ficando-se com a maior parte dos lucros, forçando famílias a viver em
condições de pobreza não é senão fabricar bombas-relógio com tempo marcado para
explodir; quando se transforma crianças e jovens em consumidores vorazes, mesmo
que não tenham condições econômicas para sê-lo; quando se toma o poder político
para fazê-lo servir ao poder econômico de certos grupos não é viver como uma
sociedade sem juízo que verá a sua casa ruir certamente?
Sim,
nestas reflexões quero concluir que chegamos até aqui porque viemos caminhando
nesta direção. Não foi fruto do acaso o que estamos vendo (e que pode ser
apenas o começo!), mas de escolhas que fizemos. Nosso mundo está doente porque
não tem colocado em prática o que Cristo nos ensinou e precisa urgentemente de
cura, como continua a música que citei, “mas é tempo de mudança, de voltar para
o Senhor, e de se cantar com a vida que mais forte é o amor!”.
“Que
Jesus Cristo ressuscitado nos possibilite renascer com Ele em sua Páscoa para a
vida livre e verdadeira, distante dos horizontes da tristeza da morte!”
Feliz
Páscoa a todos!
Pe
Walter
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